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Consciência negra: qual a origem da data celebrada em 20 de novembro

Data foi escolhida por ser o dia da morte de Zumbi dos Palmares, e pretende destacar os movimentos de resistência negra à escravidão

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Redação Brasil de Direitos

6 min

Consciência negra: data relembra o dia em que Zumbi dos Palmares foi assassinado (Foto: Mídia Ninja)

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O Dia Nacional de Zumbi dos Palmares e da Consciência Negra, celebrado no 20 de novembro, é feriado em todo o Brasil desde o final de 2023. Antes disso, somente pouco mais de mil cidades (das  cerca de 5,5 mil que há no país) observavam a data.

A mudança pode até ser recente, mas o Dia da Consciência Negra é um marco no calendário do movimento negro brasileiro há mais de 40 anos.

Como surgiu o 20 de novembro

A história do 20 de novembro começa na Porto Alegre de 1971. Foi naquele ano que surgiu o grupo Palmares, formado por quatro universitários negros gaúchos: Oliveira Silveira, Antônio Carlos Côrtes, Ilmo da Silva e Vilmar Nunes.

Os quatro se incomodavam com a maneira como a historiografia oficial, especialmente naqueles anos de ditadura militar, retratava o fim da escravidão no Brasil. A visão mais propagada nos livros da época dava destaque ao papel da princesa Isabel como uma espécie de “redentora”. E tratava a população negra como uma beneficiária passiva da abolição.

>>Leia também:3 abolicionistas negros que você precisa conhecer

O discurso oficial ignorava a atuação de diversas lideranças negras que, ao longo de séculos, atuaram na luta contra a escravização. Nomes como o do engenheiro negro André Rebouças, cujo projeto de abolição incluía um plano de distribuição de terras à população liberta.

Outra figura posta em segundo plano era a do líder quilombola Zumbi dos Palmares. Zumbi nasceu livre em meados do século XVII, mas foi capturado e escravizado. O quilombo de Palmares, que ele liderou, foi o maior do período colonial: calcula-se que chegou a abrigar, de uma vez, mais de 20 mil pessoas negras e indígenas. Por mais de 100 anos, Palmares enfrentou investidas das tropas coloniais. Dadas as suas dimensões, funcionava como uma espécie de Estado independente dentro do Brasil (que, na ocasião, era uma colônia portuguesa)

 

Símbolo de resistência negra

O quilombo de Palmares resistiu até 1695, quando bandeirantes paulistas mataram Zumbi no dia 20 de novembro daquele ano.

Quase três séculos depois, o advogado Antônio Carlos Côrtes encontraria por acaso, na biblioteca municipal de Porto Alegre, um livro que coroaria as discussões que ele e os amigos tinha a respeito da luta negra contra a escravidão. “O Quilombo de Palmares“, de Edison Carneiro, recontava a historia da luta Palmarina. E descrevia Zumbi como uma liderança corajosa e hábil.

>>Leia também:13 de maio: como a população negra lutou por direitos depois da abolição

“Eu levei o livro para os demais, todos leram, e ali nasceu o grupo Palmares”, disse Côrtes em entrevista ao projeto Google Arts and Culture.

Nasceu também a proposta de alçar a data da morte de Zumbi a símbolo da resistência negra, em contraposição ao 13 de maio, data de assinatura da Lei Áurea.

O primeiro Dia da Consciência Negra aconteceu ainda em 1971, no clube Náutico Marcílio Dias, em Porto Alegre. Reuniu duas dúzias de estudantes negros, que discutiram o legado da escravidão para o Brasil.

>>Leia também: Depois da abolição, Estado sofisticou mecanismos de exclusão, diz historiadora

No dia seguinte, Oliveira Silveira, outro membro do grupo, publicaria uma coluna no jornal gaúcho Correio do Povo, aconselhando  “os negros do Brasil – quando não os brasileiros em geral” a “fazer as maiores comemorações, reverenciando a memória de nossos heroicos antepassados” no dia 20 de novembro.

O grupo Palmares acabou de desfazendo em 1978. Àquela altura, a ideia do 20 de novembro já tinha se espalhado pelo país.

Uma abolição incompleta

As discussões do grupo Palmares ecoaram entre ativistas do movimento negro que já questionavam o discurso oficial sobre a abolição da escravidão.

Era o caso dos membros do recém-fundado Movimento Negro Unificado (MNU). Criado em 1978, em plena ditadura militar, o Movimento Negro Unificado nasceu em reação a três casos de racismo que marcaram a época: a prisão e o assassinato, pela ditadura, do feirante Robson Silveira da Luz, que fora acusado de roubar frutas; o assassinato do operário Milton Lourenço, morto pela polícia; e a discriminação de quatro jogadores de vôlei negros pelo Clube Regatas do Tietê. O grupo, que passou a reunir dezenas de entidades do movimento negro, realizou uma manifestação diante do Theatro Muncipal de São Paulo — e, a partir dali, passou a organizar as demandas do movimento negro que, por fim, seriam apresentadas durante a elaboração da Constituição Federal de 1988.

>>Leia também: Regina Santos, do MNU: “Para avançar, é preciso passar o Brasil a limpo”

No dia 13 de maio de 1988, cem anos após a abolição da escravidão no Brasil, o MNU lançou o slogan “A princesa esqueceu de assinar nossa carteira de trabalho”. A intenção era apontar como, um século depois da abolição, a população negra brasileira era alvo do racismo, que se traduzia em salários menores e piores condições de vida de maneira geral. Na leitura do MNU, a abolição fora curta e incompleta.

No dia 11 de maio daquele ano, aconteceria ainda a “Marcha dos negros contra a farsa da Abolição”, no Rio de Janeiro. A manifestação foi organizada pelo Instituto de Pesquisas das Culturas Negras (IPCN), e reuniu milhares de pessoas no centro da capital carioca. A partir daí, a figura redentora da princesa Isabel foi substituída pela de Zumbi dos Palmares: um símbolo de luta e de resistência dos negros à escravidão.

Em 2011, a então presidente Dilma Rousseff oficializou o caráter nacional da data. E, no ano passado, o presidente Lula sancionou a lei que fez do Dia da Consciência Negra feriado nacional.

 

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