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A pobreza é fruto de políticas públicas, diz Edgar Villanueva

Para autor americano, filantropia precisa rever práticas, e empoderar comunidades para que influenciem a construção de políticas de combate à desigualdade

Rafael Ciscati

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O norte-americano Edgar Villanueva acredita ter um perfil incomum para o mundo da filantropia. O termo se refere ao universo de fundações e institutos sem fins lucrativos – muitos deles mantidos por famílias e empresas  – que doam recursos e desenvolvem trabalhos em favor de uma causa. A educação de crianças ou o combate ao desmatamento, por exemplo. Indígena, filho de uma faxineira, Villanueva trabalhou por quase 20 anos assessorando fundações. Nesse tempo, circulou por ambientes onde pessoas racializadas, como ele, eram minoria. A ausência de negros e indígenas não era exatamente um mistério. “Basta pensar em quem tem dinheiro para fazer filantropia”, diz ele. “E quem tem poder para dizer como serão usados esses recursos”. 

Nos últimos cinco anos, Villanueva decidiu mudar sua atuação: deixou de ser um perfil dissonante para assumir o posto de figura (quase) incômoda. Em 2018, o ativista publicou o livro Decolonizing Wealth (algo como “Decolonizando a riqueza “, em tradução livre). Na obra, ainda sem edição no Brasil, defende que as organizações filantrópicas devem mudar a maneira como trabalham. Em lugar de pretender defender os direitos de grupos minorizados, os filantropos devem apoiar movimentos sociais nascidos nessas comunidades – de modo que esses movimentos possam, eles próprios, influenciar no desenho de políticas públicas.  É essa,diz, a provocação que ele faz ao visitar empresas e fundações, às quais presta consultoria. “As comunidades sabem quais são as respostas para os seus problemas”, afirma. “Afinal, sobrevivemos há anos nessa realidade adversa”. 

Viallanueva foi uma das principais atrações do 12ºCongresso do Grupo de Institutos, Fundações e Empresas – GIFE. Realizado entre os dias 12 e 14 de abril, em São Paulo, o evento se propôs a discutir qual o papel da filantropia no combate às desigualdades. Segundo o ativista, para entender onde estamos, é preciso olhar para o passado. “Nossas comunidades já foram muito ricas, mas essas riquezas foram tiradas de nós”. 

Villanueva lembrou que durante séculos, pessoas negras e indígenas foram escravizadas, mortas e expulsas de suas terras. Esse processo de dominação colonial se amparou em ideias racistas, segundo as quais alguns povos seriam superiores a outros. Ainda hoje, populações inteiras vivem os reflexos desse processo. “Não falo disso com o objetivo de envergonhar as pessoas. Simplesmente, é preciso reconhecer que a riqueza de alguns foi gerada pela colonização”, afirmou, durante sua apresentação no Congresso. Foi também a colonização, diz ele, que criou a pobreza. A mesma que, hoje, leis e políticas públicas se encarregam de manter (ou falham em combater). “As pessoas pobres não criaram a pobreza. Ela foi intencionalmente criada. A pobreza é resultado de políticas públicas”. 

Villanueva brinca que as sociedades contemporâneas parecem infectadas por uma espécie de “vírus colonizador”. Seus sintomas se manifestam de muitas formas: dos movimentos de supremacia branca até  – provoca ele – às práticas tradicionais da filantropia. “É claro que somos todos pessoas boas”, brincou Villanueva, dirigindo-se à plateia do congresso. A audiência era formada, majoritarimente, por pessoas que atuam em fundações filatrópicas. “ Mas trabalho nesse universo há 20 anos. E, nesse tempo, vi muitas boas intenções ficarem pelo caminho”. 

Segundo ele, fundações (mesmo as mais bem intencionadas) são infectadas pelo “vírus colonizador” quando tentam impor seu modo de trabalho às comunidades e organizações que dizem apoiar. Ou quando relutam em doar para movimentos oriundos de comunidades racializadas. Nos EUA, somente cerca de 8% dos recursos de filantropia são destinados a organizações lideradas por pessoas negras ou indígenas. Para Villanueva, se quiser desafiar desigualdades, a filantropia precisa mudar essas estatísticas. “Precisamos empoderar comunidades, para que elas influenciem a construção de políticas públicas”.  

Foto de topo: Divulgação/GIFE

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