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Crise do clima: como as chuvas extremas no Acre afetam a população negra e pobre

Quando chuvas torrenciais fizeram o rio Acre transbordar, as casas em Rio Branco foram invadidas por água, ratos e cobras. Qual o plano para conter os efeitos da crise do clima?

Almerinda Cunha

4 min

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A cidade de Rio Branco, no Acre, é dividida por um rio. Um curso d’água que leva o mesmo nome que o estado. No final de março de 2023, essa barreira natural, que costuma dividir o município ao meio, desapareceu. Ou melhor: transbordou. Turbinado por chuvas torrenciais, o rio Acre cobriu a cidade de água. Invadiu ruas, casas, escolas. O governo decretou situação de emergência. Mais de duas mil pessoas foram desalojadas.

O fenômeno das enchentes no Acre é antigo, e piora ano a ano. Com desmatamento e chuvas torrenciais constantes, a coisa complica. As chuvas do final de março, no entanto, tiveram algo de incomum. 

Veja: historicamente, fevereiro é o mês em que mais chove em Rio Branco. Em média, 292 mm. Em março deste ano, o volume de chuvas fugiu à curva da normalidade. Num único dia (o fatídico dia 23) caíram 124,4 mm de chuva, de acordo com medições do Instituto Nacional de Metereologia (Inmet). Isso significa que, num único dia, choveu quase a metade do previsto para o mês mais chuvoso. A água foi tanta, que o Inmet registrou as chuvas daquele final de março na sua lista de eventos climáticos extremos. 

As chuvas são comuns na Amazônia. Os eventos climáticos extremos, esses são novidade. Cientistas dizem que, com o avanço da crise climática, eles devem se tornar mais comuns. Conforme o planeta aquece, as populações mais pobres é que sofrem mais. 

A ciência é cautelosa: os cientistas entendem que nem sempre é possível vincular um determinado evento ao avanço da crise do clima. No entanto, dá para dizer com segurança que, se as temperaturas do planeta continuarem a subir, as cenas que presenciamos aqui em Rio Branco em março se tornarão recorrentes. 

Para compreender o que é sofrer com as enchentes, imagine estar dormindo e acordar com água invadindo sua casa. Imagine que essa água traz esgoto, ratos, lixo e todo tipo de contaminação. O volume da água é tal que existe o risco de a correnteza levar você, sua casa, seus pertences. 

Em Rio Branco, algumas pessoas ficaram só com a roupa do corpo. Algumas perderam toda a comida que tinham. Alimentos adquiridos com muito esforço e com o auxílio do governo e de amigos. 

Houve casos em que a água não invadiu as casas, mas abriu caminho para caranguejeiras, cobras e escorpiões. Há ainda os casos de pessoas que morreram eletrocutadas. É uma catástrofe. Dentre os casos que a Associação de Mulheres Negras do Acre acompanha, há a história de uma moça que passou oito dias presa em casa, isolada pelas águas. “Em casa, a água ficou na altura do joelho. Tive que pedir abrigo a parentes. Meu filho ainda foi picado por um escorpião”, nos contou Eliane, que vive no bairro Volta Seca. Sebastiana, que mora no mesmo bairro, conta que adoeceu, depois de passar dias seguidos em contato com a água contaminada.

O que faremos se esse cenário se agravar? O que faremos se, nos próximos anos, situações assim se repetirem. 

Nas semanas que se seguiram às chuvas, a Associação de Mulheres Negras do Acre distribuiu 150 cestas básicas para a população que ficara desabrigada. Foi uma medida emergencial. Agora, organizamos rodas de conversa com a população. Nesses encontros, vamos falar sobre as consequências das mudanças do clima para a vida das populações. E sobre a necessidade de cobrar ações do poder público. Exigimos soluções.

O pedido de socorro já existe, é feito por muitos. O que governos e a sociedade farão para evitar maiores danos à vida das populações? Para evitar que as pessoas perdam seus pertences, passem fome, percam a vida?

*Esse artigo é o primeiro de uma série que Brasil de Direitos começa a publicar em junho. Em cada texto, defensores dos direitos humanos refletem sobre os efeitos do aquecimento global na vida das populações.

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