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Exposição de menina vítima de estupro fere o ECA e violenta criança

Manifestação de grupo religioso tentou impedir aborto. Criança, de 10 anos, foi estuprada pelo tio pelos últimos quatro

Pedro Ferreira

4 min

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Na tarde deste último domingo (16) um grupo de religiosos se reuniu diante de um hospital no Recife (PE) para tentar impedir que uma menina de 10 anos fizesse um aborto. Vídeos da manifestação foram publicados em sites de notícia. A criança, moradora do Espírito Santo, estava grávida de 5 meses. Ao longo dos últimos quatro anos anos, fora estuprada pelo marido de uma das tias. Teve de ser levada a Pernambuco porque o hospital em Vitória onde o procedimento deveria ser realizado se recusou a interromper a gravidez — uma garantia prevista em lei. Sua história narra uma sucessão de violações. O protesto diante do hospital configurou mais uma dessas violências.

>>Aos 30 anos, ECA reflete evolução do olhar sobre a infância

O grupo de religiosos descobriu onde o procedimento seria realizado porque informações sigilosas foram divulgadas em redes sociais. A atitude, que expôs a criança, feriu também o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que recém completou 30 nos de existência. A exposição da menina, segundo entendimento do advogado Ariel de Castro Alves — publicado na revista Fórum  — membro do Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente (Condepe) e ex integrante do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), viola o direito ao respeito, previsto na Constituição Federal e no ECA.

O direito ao respeito é matéria do artigo 17 do Estatuto: “O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, ideias e crenças, dos espaços e objetos pessoais”, diz o texto.

Na Constituição, a disposição aparece no artigo 227: “É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”. Já a incitação à violência está presente no artigo 286 do Código Penal: “Incitar, publicamente, a prática de crime. Pena – detenção, de três a seis meses, ou multa”

A baixeza dessa violência, perpetrada contra uma criança, revela o lodaçal que vivemos. É preciso, necessário, e urgente que a sociedade civil – nós, eu, você, ele e ela –  fiquemos atentos ao quadro de guerra ideológica a que estamos submetidos, muito pela falta de ações efetivas da classe política, com interesses próprios que continua ao lado desse (des)governo genocida, de características fascistas.

O fascismo se dá pela ignorância e pela provocação alimentanda pelos que deduram. Quem divulgou as informações sobre a localização da menina? É preciso descobrir. Nas redes sociais, a militante de extrema-direita Sara Giromini publicou o nome da criança, e o local onde seria realizado o procedimento de interrupção da gravidez. Giromini já fez parte do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos, da ministra Damares Alves. A pasta detinha informações sobre o destino da criança. No episódio de domingo, assistimos a vários crimes simultâneos. Todos, da violência do estupro à violência da exposição indevida, me fazem pensar que estamos falhando num dever fundamental: o de proteger a infância.

Foto de topo: grupo de religiosos protesta diante de hospital em Pernambuco / Reprodução

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