Direitos socioambientais
Cooperativas pedem autorização para garimpar várias áreas próximas, somando extensões até 28 vezes maiores que o permitido. Legislação deixa brecha para garimpo industrial

Direitos socioambientais
Garimpeiros burlam lei para explorar área maior que a cidade de SP no Amazonas
Cooperativas pedem autorização para garimpar várias áreas próximas, somando extensões até 28 vezes maiores que o permitido. Legislação deixa brecha para garimpo industrial
Rocha é um dos responsáveis pelo relatório Panorama do Interesse Minerário no Amazonas. O estudo, realizado pela Opan em parceria com a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) e com o Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS) recorreu a documentos registrados na Agência Nacional de Mineração (ANM) para avaliar o avanço da exploração mineral no estado.
Os dados mostram que, hoje, 8% do território do Amazonas é alvo de processos minerários em diferentes estágios de tramitação. Isso significa que pessoas físicas, associações ou grupos empresariais pediram à ANM o direito de explorar essas terras. A área tem tamanho equivalente à Coreia do Norte.
Quase metade dessa área (34% dela) é alvo de requerimentos que pedem autorização para garimpar ouro. No último ano, mostram os pesquisadores, o número de requerimentos para garimpo de ouro deu um salto: aumentou 320% em 2020 quando comparado à média da última década.

Dentre as descobertas, chama a atenção a maneira de atuar das cooperativas de garimpeiros. De acordo com a legislação vigente, essas associações podem requerer, na Agência Nacional de Mineração, lavras com até 10 mil hectares. “As cooperativas têm alguns privilégios se comparadas a empresas, por exemplo”, afirma Rocha. “No caso das empresas, o limite é de 50 hectares”.
Ao sobrepor os pedidos feitos pelas cooperativas ao mapa do estado, os pesquisadores perceberam que elas recorriam a uma estratégia para driblar essa limitação. Faziam vários requerimentos em terras próximas umas das outras. Somados, esses terrenos podiam chegar a ter área superior a da cidade de São Paulo.
A maior parte desses pedidos foi feita por 10 cooperativas de garimpo, que detêm a titularidade de mais de 90% da área requerida para garimpo de ouro no Amazonas.
Na avaliação do relatório, a extensão das áreas pleiteadas indica que atividades minerarias de perfil industrial estão sendo registradas como garimpo artesanal.

A estratégia das cooperativas, explica Rocha, se aproveita da indefinição da legislação brasileira, que não estabelece critérios objetivos para dizer o que é garimpo. “A legislação não avalia qual a forma de extração que vai ser utilizada para definir o que é garimpo”, diz Rocha.
A situação é duplamente vantajosa porque quem explora uma lavra de garimpo não precisa realizar um procedimento chamado “pesquisa prévia”. Ela diz, por exemplo, qual a o potencial de produção da lavra. Além de envolver menos burocracia, essa dispensa da pesquisa prévia abre brechas para atividades ilegais. Rocha conta que o ouro obtido em garimpos ilegais pode ser registrado como proveniente de garimpos legalizados, uma vez que estes não precisam apresentar estimativas de qual seu limite de produção.
O relatório ainda aponta que a maior parte das lavras requeridas à ANM não está em operação hoje, nem tampouco foi autorizada. Parte dos requerimentos está sobreposta a 19 unidades de conservação e terras indígenas — territórios onde, hoje, essas atividades não podem ser realizadas. Segundo Rocha, isso sugere que essas cooperativas têm a expectativa de que a legislação vigente será flexibilizada, para admitir garimpo em áreas protegidas. “Ao protocolar esses requerimentos de lavra, as cooperativas tentam reservar áreas para explorar no futuro”, conta Rocha.
Foto de topo: Victor Paiva / divulgação Opan
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