Não tem vacina contra o racismo ainda…
Negacionismo, desinformação, falta de oxigênio e compra inadequada de vacinas compõem trajetória de erros que levaram à morte 330 mil brasileiros, em sua maioria negros e negras
Lúcia Xavier
4 min
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A vacina, símbolo da esperança no enfrentamento definitivo da pandemia de Covid-19, não está chegando à população negra no mesmo ritmo em que chega aos brancos no Brasil. Dados recentes do Ministério da Saúde divulgados pela imprensa mostram que, até 22 de março de 2021, os brancos (38%) representavam quase o dobro dos pardos ou pretos (21%) entre os vacinados. Os números refletem uma dura realidade relacionadas às desigualdades decorrentes do racismo.
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Estamos, novamente, mais vulneráveis ao vírus. A vacina contra Covid-19 foi disponibilizada inicialmente para idosos e para profissionais de saúde. Se a expectativa de vida dos negros é menor que de brancos, já é fácil entender por que começamos atrás. A esse critério somam-se questões básicas como dificuldades de acesso a postos de saúde e o descaso com grupos vulnerabilizados como quilombolas, população em situação de rua e encarcerada.
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Segundo levantamento do Observatório Direitos Humanos Crise e Covid-19, do qual Criola faz parte, esses grupos só estão incluídos como prioritários nos planos de vacinação de menos da metade das unidades da federação e das capitais. São inúmeras famílias que já viviam em condições precárias e que, agora, enfrentam um acirramento de desigualdades no acesso a renda, educação, alimentos e a água, item importante para a prevenção contra a Covid-19.
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A descoordenação de políticas em âmbitos nacional, estadual e municipal também é apontada pelo Observatório como prejudicial para o planejamento geral da imunização. É o que acontece na região Metropolitana do Rio de Janeiro, por exemplo, com pouco mais de 5% da população vacinada – sendo que em alguns municípios, como São Gonçalo, o índice sequer chega a 1%. Sem transparência e com erros graves na comunicação social, os municípios da região têm assistido a filas, aglomerações, desinformação e corrida por vacina em postos da baixada fluminense. Disputas políticas têm tornado o quadro ainda mais caótico e arriscado para os mais pobres.
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Justamente no momento quando a pandemia alcança a casa dos 332 mil mortos, a Câmara Federal aprecia o Projeto de Lei nº 948/2021, desobrigando as empresas que comprarem vacinas a doarem uma parte para o Sistema Único de Saúde – denominado #Projeto Fura-Fila.
Por fim, os planos de imunização em curso ignoram a vulnerabilidade de tantos trabalhadoras e trabalhadores privados da possibilidade do isolamento social, como faxineiras, cuidadoras, motoristas, entre outros. É evidente que boa parte desses profissionais – em sua maioria, negras e negros – deveriam estar entre os primeiros grupos a serem vacinados.
Ao que tudo indica, o Estado perdeu a chance de corrigir os rumos a favor da redução das iniquidades de raça e gênero no Brasil. Agora, a população negra precisa convocar a sociedade para pôr fim ao dilema ético que o acesso à vacinação nos aponta. A vacina deve ser para todos, todas e todes!
*Lúcia Xavier é coordenadora geral de Criola, organização da sociedade civil com 29 anos de trajetória na defesa e promoção dos direitos das mulheres negras.
Publicado, originalmente, no site da instituição.
Foto de topo: Tânia Rego / Agência Brasil
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