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Visibilidade Lésbica: queremos políticas públicas para garantia do bem-viver

Invisibilizadas na formulação de políticas públicas, mulheres lésbicas enfrentam preconceito e violência letal. É preciso ação do poder público

Maria Teresa Ferreira

7 min

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A história de mulheres que se relacionam afetivo-sexualmente com outras mulheres não representa nenhuma novidade em nossa sociedade. No entanto, a violência e a discriminação continuam a dificultar ou impedir seu acesso a serviços básicos como saúde, educação e mercado de trabalho, além de colocar suas vidas em risco constante.

Hoje, no início do século XXI, apesar dos avanços e de algumas conquistas oriundas das lutas de diversos movimentos, o aumento dos casos de lesbocídio comprova a tentativa violenta de invisibilizar o papel das mulheres lésbicas na sociedade: dados dos Grupo Gay da Bahia (GGB) mostram que, entre 2020 e 2021, o número de lesbocídios cresceu 20%.  A sociedade ainda não aceita, plenamente, a existência dessas mulheres como pessoas em igualdade de direitos e deveres. Esse comportamento social inviabiliza seu direito ao exercício político, à vida cidadã, e à expressão da sua sexualidade.

No conjunto das letras que caracterizam as especificidades de gênero e orientação sexual, a letra L, ainda que esteja à frente da sigla, permanece na invisibilidade quando falamos de políticas públicas, principalmente investimentos e financiamentos.

O Dia Nacional da Visibilidade Lésbica, celebrado em 29 de agosto, é um dia dedicado não só a comemorações, mas a discutir políticas públicas de combate à lesbofobia e formas de dar maior visibilidade à comunidade lésbica. A data foi escolhida em razão do 1º Seminário Nacional de Lésbicas (SENALE), que aconteceu em 1996 no Rio de Janeiro/RJ, no qual as lésbicas presentes discutiram demandas sobre espaços autônomos de articulação política, promoção da saúde, direitos sexuais, direitos reprodutivos, combate IST, HIV/Aids e a defesa do Sistema único de Saúde – SUS.

Historicamente as mulheres lésbicas são invisibilizadas na formulação de políticas públicas, especificamente nos equipamentos de saúde, ocasionando o afastamento e evasão. O movimento de mulheres lésbicas no Brasil nas últimas décadas fez apontamentos sérios referentes à saúde das lésbicas. Possuímos demandas específicas de saúde que são, invisibilizadas pela lesbofobia institucional, principalmente na atenção primária, o que diminui a qualidade de vida e intensifica o processo de saúde – doença reduzindo as chances de tratamento e cura.
Ainda no campo da saúde, terapias de reorientação sexual ou de reversão, a conhecida “Cura Gay”, aquelas que têm por objetivo “curar” orientações sexuais dissidentes, ainda encontram espaço com alguns profissionais da saúde, desconsiderando os desejos e aceitação de si como elementos principais na formação dos indivíduos. Superar o patriarcado, a lesbofobia, o machismo e o fundamentalismo religioso, para as mulheres lésbicas são um desafio permanente para alcançar os direitos humanos e a proteção destes direitos.

O Brasil pactua ainda nos dias de hoje, com a prática de privação de liberdade em hospitais e instituições psiquiátricas, dentre elas mulheres lésbicas forçadas a terapias de reversão e a estupros corretivos. Essa terrível experiência nos convoca a repensar sobre o cuidado em saúde mental e as construções sociais relativas a determinados sujeitos. Embora haja amplo arcabouço legal que impeça a existência dessas instituições, elas ainda existem com outros nomes e sob a justificativa do cuidado e muitas vezes atrelados a instituições religiosas ditas cristãs.


A situação das mulheres lésbicas dentro do sistema penal é ainda mais grave, visto que se acentuam outras graves violações, principalmente no acesso à saúde básica, como fornecimento dos produtos de higiene, remédios, atendimento ginecológico adequado e medidas de prevenção para práticas sexuais. De fato, é urgente o cumprimento do que é previsto no art. 11 da Lei de Execução Penal, além da prática da Política Nacional de Atenção Integral à Saúde das Pessoas Privadas de Liberdade (PNAISP), política pública de saúde específica que garante acesso à saúde e reintegração à sociedade, de forma a garantir saúde física, psíquica e emocional dessas mulheres.

Falta de estatísticas oficiais
Sabe-se que o lesbocídio no Brasil tem altos índices, porém, não existe um monitoramento por parte do Estado que possa subsidiar a formulação de políticas públicas sociais de proteção às lésbicas. O único documento que relata as violências sofridas pelas mulheres lésbicas é o Dossiê sobre Lesbocídio no Brasil: de 2014 até 2017, que não teve atualização de dados desde 2017. Um dado importante do Dossiê é o alto índice de violência contra as lésbicas não-feminizadas e também contra as lésbicas negras.

Atualmente o movimento de lésbicas brasileiro, desenvolve uma pesquisa intitulada Lesbocenso, que se trata de um mapeamento nacional de lésbicas, por meio de um questionário virtual que foi disseminado por diversos meios em busca da construção de dados mais amplos e detalhados sobre a condição de vida das lésbicas no Brasil.

O lançamento do Lesbocesno foi realizado nessa segunda-feira (29), num evento organizado pela Comissão da Diversidade Sexual e de Gênero da OAB/PE, pela Associação Brasileira de Lésbicas (ABL), pela Comissão do LesboCenso Nacional (@lesbocenso), pela Rede Nacional de Lésbicas e Bissexuais Negras e Feministas- CANDACES (@candaces_br), pelo Coletivo de Lésbicas e Mulheres Bissexuais – COMLESBI – PE (@comlesbi), pelo Coturno de Vênus – Associação Lésbica Feminista de Brasília (@coturnodevenus)  e pela Liga Brasileira de Lésbicas – LBL (@ligabrlesbicaspr).

O evento também conta com a  parceria da Comissão da Mulher Advogada da OAB/PE (@cma.oabpe), da Comissão de Igualdade Racial da OAB/PE (@c.igualdaderacialpe) e do Comitê Interinstitucional Pró Lésbicas e Mulheres Bissexuais.
Ainda são pautas do movimento de lésbicas no Brasil:

  • Fortalecimento do Sistema de Informação de Agravos de Notificação – SINAN para construção políticas de proteção e o enfrentamento ao do alto índice de violência contra mulheres lésbicas e bissexuais, contribuindo para produção de dados científicos que possam corroborar com a demanda social e política do movimento de lésbicas.
  •  Ambulatórios estaduais direcionado à população lésbica;
  •  Incentivo de pesquisas sobre a feminização do HIV/Aids com recorte sobre as lesbianidades
  •  Maior debate sobre os direitos reprodutivos das mulheres lésbicas dentro do PAISM e garantia ampla dos direitos da dupla maternidade;
  •  Formação continuada de profissionais de equipamentos públicos que atendem a população lésbica.
  •  Construir políticas públicas específicas que garantam a segurança para as denúncias de crimes policiais, totalmente amparados pelos órgãos de segurança do Estado.
  •  Criar mecanismos legais e sociais que permitam o monitoramento das ações policiais com o objetivo de mitigar o abuso de autoridade e fornecer treinamento baseado em direitos humanos e diversidade aos policiais dentro das penitenciárias e fora delas.
  •  Acesso à justiça e reparação as mulheres lésbicas que passam por brutalidade policial, bem como acesso mais fácil ao tratamento psicológico, via defensoria pública e SUS
  •  Assegurar e implementar políticas de educação inclusiva, coerentes com os parâmetros do Plano Nacional de Educação 2014-2024.
  • Assegurar as estratégias, diretrizes e fiscalização para organizar e atender as pessoas com necessidades e tratamentos específicos em saúde mental, conforme a Política Nacional de Saúde Mental.
  • Revisão da política antidrogas.
É preciso desconstruir a imagem de que há um sujeito a ser corrigido e esse é um trabalho que envolve gestores públicos, profissionais de saúde e instituições voltadas à promoção e proteção da vida, para que possamos construir uma cultura de segurança para que se garanta o pleno bem viver das mulheres lésbicas.
Uma contribuição de Imagem ilustrativa

Momunes

Sorocaba - SP

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